O poeta diz talvez. E tu que dizes? Tu que vives
a vida de fora para dentro, comandado
por estímulos que entram maquilhados no teu sono e no teu sonho
e que acordam contigo sem alguma vez terem despertado.
Sofres porque habitas um palácio imaginário.
Sofres porque sabes como te chamas mas ignoras quem és.
Sofres porque fechas as janelas da tua casa e as janelas do teu espírito
mas a vida não pára de preparar surpresas
para quando abrires a porta na manhã seguinte
Sofres porque cada orgasmo é uma festa maravilhosa que te estremece apenas o corpo.
Sofres porque cada satisfação tua foi atingida com um imenso rol de profundas insatisfações.
Sofres porque quase sempre o que tu desejas não é o que tu queres.
Sofres porque não vais além do coração e porque o coração não vai além de ti. E porque ambos se atrapalham.
Sofres porque tens medo e porque tens medo de ter medo.
Sofres porque tens dificuldade em olhar para a frente, partir de ti para um outro tu,
e porque olhar fixamente para trás te pode transformar numa estátua de sal.
Sofres porque a tua honestidade é desonesta e a tua consciência é um juiz
que tu mesmo te encarregas de corromper. Sofres
porque a tua infâmia pode preencher a primeira página
e porque a primeira página nunca fala de ti nem que seja para mostrar a tua infâmia.
Sofres porque é grande a sensação de ameaça
e porque enorme é o tédio e porque é fundo o desespero.
Sofres porque as razões porque és feliz são as mesmas razões da tua infelicidade.
Sofres porque é amarga a vida e doce a ilusão e insonsa a esperança.
Sofres porque sabes tudo isto e desconheces tudo isto
e porque o conhecimento das coisas e o desconhecimento das coisas
são sempre a primeira e a última das razões
para invocares o teu inútil sofrimento.
Joaquim Pessoa
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